fome. estampada. a vida como ela é, vestida.

A cada vestir, pode ter certeza, cabe o seu investir.

Sei lá se vai virar coluna, se é só por hoje ou se pra sempre. Foto do
Sartorialist.

carteira_vermelha

Não fumava mais, então teria que se apoiar em outra tragada. Beber ainda estava ácido e derrubou o rum. Era o que tinha na geladeira. Valia. A preguiça de fazer gelo nunca custou tão caro. Se bem que alguma pureza ia ser bom, mesmo que confrontada à gastrite. Fez o copo e foi para o quarto. Rum rasgando a garganta, já machucada e entalada. O resto foi orgia alcoólica no estômago. Foda-se a dor. Amanhã eu cuido disso. Cuidou.

Acordou com a dor na cabeça. Levantou. O rum de um trago só lhe deu bom dia. Correspondeu e foi escovar os dentes. Achou por bem um banho e se aguou. Caralho, que falta faz um cigarro, mais que o outro lado da cama, o que pensou. Tudo bem, já era de manhã. Despertar está para a gramática assim como o sol para o dia. A escova de dentes foi a constatação, o que já tava de bom tamanho. O armário seria a redenção, mas o tamanho não era bom não.

Por que insisto tanto na insistência?! Tá tudo bem comigo, mesmo que não ao mundo. Onde é que já se viu se sentir deslocada da locação humana por não se permitir deprimir?! Eu já. Me vi. Essa coisa de se encaixar é uma merda… busco tão cegamente a colocação que me esguio no tormento da solidão. A gente se dá bem, e agora?

Ele se esvaiu no meio da madrugada, já não a sem tempo. Sim, eu sei, me diverti e em rima pobre digo que a contento, mas tem que ter mais? Simpático, ele se chegou. Solícito até. Engatou um tal de Leminski que de letra me interessou. Rebati em apelo publicitário porque é o que sei apelar. Ele comprou. Não tinha nem rum nem geladeira e a cachaça de jabuticaba foi a que se plantou. Que é que vim fazer aqui? Ah, a Carol me pediu, deprimida e mundana que é.

Fomos pra casa. Já disse, sou bem resolvida. Se não, digo agora. Sou. A orgia da noite se abriu, antes da alcoólica, pois a todo bem se resolver tem um custo que não me custa o preço, foda. Comi e adormeci. Pode ir, peço. Tranca a porta e joga a chave por baixo, rasteira e direta.

Despertei a madrugada acordada pela abstinência da ausência tragada. Rum. Que porra é essa de garganta fechada? Deve ser a influência do mundo… Manhã, banho, escova de dentes e armário. O rum é mais fácil. Nove e meia, preciso apelar. Calça amassada pra combinar com a cara, paletó sequinho porque de namorado não quero nem o dele, carteira vermelha com argola pingente pra lembrar do que me consente e bracelete de prata porque tava engarrafado no perfume que não me cheirou essência.

E camiseta de silhueta de boca porque tenho fome de tudo – que é deprimido e que, humanamente, não me é comprimido.

Analgésico no rum, rum na boca e no nó, dor que virou dó. A chave é a saída não rasteira e direta. Mas é minha. E concreta.

Dez horas, apelação.

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4 Respostas to “fome. estampada. a vida como ela é, vestida.”

  1. Nitz Says:

    A cada vestir, cabe o seu investir. 😉

  2. alda Says:

    “Essa coisa de se encaixar é uma merda…” amiga digo isso p/ mim todos os dias como um mantra p/ ver se deixo essa babaquice de lado e vou ser feliz, simples assim!
    adorei o texto, arrazou como sempre :)))
    bjos

  3. Fique por dentro Fome » Blog Archive » fome. estampada. a vida como ela é, vestida. « o avesso do espelho Says:

    […] é só por hoje ou se pra sempre. Foto do. Sartorialist. carteira_vermelha … fique por dentro clique aqui. Fonte: […]

  4. Cada um faz o que pode « o avesso do espelho Says:

    […] preferi; fiz um post-resposta lúcido e consciente a uma grande jornalista quando achei por bem e inventei curtas por trás de frames de moda quando não pude mais não o fazer. Isso dentre outras tantas coisas que mais de um ano de Avesso […]

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